Produtores mantêm esperança em bom ano agrícola

Após dois anos de seca, das piores estiagens dos últimos 40 anos, em Cabo Verde há quem, embora sinta que as chuvas estejam atrasadas, mantenha a esperança de que ainda vai a tempo de ter uma boa “azágua”. O Governo, por seu turno, diz que ainda é cedo para falar em mau ano agrícola e garante estar a trabalhar em todos os cenários possíveis.

Helena Tavares, 60 anos, agricultora da localidade de Milho Branco, concelho de São Domingos, no interior da ilha de Santiago, conta que, há duas semanas lançou as sementes à terra, na esperança que as mesmas germinem com a chegada da “chuva amiga e ingrata”.

“Este ano foi mesmo difícil arranjar sementes, mas graças a Deus, a minha irmã trouxe-me algumas de Assomada. A outra metade fui buscar numa tia em Gudim, São Domingos”, conta Helena, revelando que as sementes foram insuficientes para o total de terreno que possui. “Não plantei muito, apenas o que deu com as sementes que eu tinha”, lamenta.

Também homem do campo, Jaílson Estevão, 30 anos, morador de Cruz Grande, em Assomada, conta que não foi difícil arranjar sementes que há cerca de um mês semeou nos arredores da sua casa. Conforme explica, tinha em casa parte das “poucas” sementes que colheu no ano passado. “No ano passado não choveu tanto quanto desejamos, mas, deu para comer e guardar um pouco”, afirma.

Na ilha do Maio, mais precisamente na localidade de Ribeira Dom João, Manuela Ribeiro, 42 anos, diz que ainda não fez a sementeira, pois prefere esperar pela chuva. “Ainda não semeamos, estamos à espera da primeira chuva, tenho esperança”, diz Manuela, contando que as sementes foram-lhe fornecidas pela delegação do Ministério da Agricultura e Ambiente. “Deu-nos congo e sapatinha, assim que chover começamos a semear para não desperdiçar as sementes”, diz.

Vivendo a seca

O país está a passar por uma das piores secas nos últimos 40 anos. Quem o disse foi o ministro da Agricultura, numa das suas declarações, em 2018, à Rádio de Cabo Verde, comparando com a seca de 1977 e a seca de 1947. No mesmo ano, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) incluiu Cabo Verde na lista de países a necessitar de assistência alimentar externa. Entretanto, na altura, o Primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, garantiu que a situação não é de crise alimentar.

Porém, em Janeiro de 2019, o Governo reconheceu que o país atravessa mais um ciclo de seca, num contexto de mudanças climáticas. O ministro da Agricultura e Ambiente, Gilberto Silva, afirmou que o cenário é assumido como um dos maiores desafios do país, alinhando políticas públicas que permitam tornar o setor mais resiliente.

Nisto, embora com a ajuda do Governo, as pessoas do campo têm lutando para conseguirem desenvencilhar-se como podem. Helena Tavares, por exemplo, conta que tem de acordar todos os dias às 6 da manhã para cuidar dos animais que pastam na sua exploração.

“Em 2017, comprei palha e desenrascámos, mas no ano passado foi um pouco melhor, porque o pouco que choveu deu para ter pasto, e este ano tenho palha, eu vendi uma parte, mas guardei um pouco. Até porque a chuva está atrasada”, lamenta a camponesa em declarações à imprensa.

Enquanto alimenta os animais com palha e rações, Helena Tavares, declara que ainda tem esperança de um bom ano agrícola para que no próximo ano possa haver mais palha, já que a escassez de água não permitiu ter tanto quanto gostaria.

Já em Ribeira Dom João, ilha do Maio, Manuela Ribeiro diz ter encontrado uma outra solução como forma de encarar a seca. “Sem palha a solução foi a ração que ainda assim não era suficiente. A solução foi matá-los e comer”, conta esta mulher do campo que cria cabras e investe na produção de queijo.

Jailson Estevão, por seu turno, repete as declarações de Helena Tavares e Manuela Ribeiro. “Com o pouco de palha que tínhamos, comprámos ração e deu para desenrascar no dia-a-dia, e por enquanto conseguimos ultrapassar o mau ano agrícola”, lastima o camponês.

Combate à seca

O Governo está a trabalhar em todos os cenários possíveis na preparação do ano agrícola, agora que estamos na época das chuvas. Garantia deixada este fim-de-semana, pelo ministro da Agricultura e Ambiente, Gilberto Silva.

O governante falava sábado aos jornalistas, em São Domingos. E para o ministro, ainda é cedo para se saber como decorrerá o ano agrícola.

“Num cenário em que as coisas não corram bem, o governo entrará com medidas adicionais de mitigação. Temos trabalhado fortemente nas medidas de resiliência e que tem a ver essencialmente com a mobilização da água”, acrescentou.

Gilberto Silva refere que o país tem que reforçar a aposta do uso da água salobra e dessalinizada na agricultura.

Conforme escreveu a Agência Lusa, a FAO tem um projeto-piloto que vai permitir a utilização de águas residuais, após tratamento, para agricultura em Cabo Verde, para mitigar os efeitos da seca. De acordo com a mesma fonte, este projeto-piloto tem componentes no Mindelo, ilha de São Vicente, e no Tarrafal, ilha de Santiago, irrigando dois hectares de terrenos. Um investimento global de 390 mil dólares, cerca de 40 mil contos.

Apesar de várias tentativas, não foi possível obter informações do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica em relação às previsões das chuvas. Entretanto, segundo o Site cv.freemeteo.com, na quinta-feira (29) há hipótese de chuvas. Entre sexta-feira e domingo o céu vai estar nublado com uma temperatura mínima de 25º. Na segunda-feira, segundo as previsões do site, haverá chuva com possibilidade de trovoada.

Fonte: Expresso das Ilhas

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