Boa Entrada é uma “pérola” ainda por explorar

Boa Entrada é uma das localidades do concelho de Santa Catarina com forte potencial agrícola e turístico, mas pouco ou nada explorada localmente pela suas gentes. O excedente de produção de fruta perde-se, por ninguém apostar na sua transformação.

O vale verdejante de Boa Entrada, situado a poucos quilómetros do centro da cidade da Assomada, no concelho de Santa Catarina, para além de ser um pomar de frutas e hortaliças, ostenta também o majestoso “Poilão”, árvore centenária, das mais antigas de Cabo Verde, que é uma atração turística. O percurso de menos cinco minutos para quem vai de carro, ou 20 minutos a pé até o “Pé de Poilão”, é feito numa estrada calcetada, curva-contra-curva, que passa no meio de pequenos povoados, onde os moradores saúdam os visitantes com carinho.

A economia local gira à volta da agricultura, produção de grogue e pecuária. Em conversa com o A NAÇÃO, alguns moradores reconhecem que as potencialidades de Boa Entrada não estão a ser bem aproveitadas, por falta de ousadia dos jovens e fraco apoio das autoridades. Isso porque atualmente a única aposta na transformação dos produtos locais é a produção de grogue.

O excedente de produção de fruta, nomeadamente manga e papaia, perde-se; ninguém, da comunidade, aposta na transformação destes produtos em doces ou compotas para vender com valor já acrescentado.

Já a nível do turismo, Boa Entrada é um dos principais pontos de visita no concelho de Santa Catarina, por causa do “Pé de Poilão” que mensalmente receber centenas de visitantes estrangeiros e nacionais. Apesar disso também, a comunidade quase nada lucra com isso também. Os turistas fazem-se fotografar junto ao imponente árvore e vão-se embora, sem comprar uma garrafa de água sequer no local. Mesmo que quisessem não há ninguém por perto oferecer qualquer que seja o produto ou serviço.

Estagnação

Carlos Mendes, “Caú”, presidente da Associação Educativa e Comunitária de Boa Entrada, considera que o desenvolvimento dessa zona está um “bocadinho lento”. “Não sou natural da Boa Entrada, mas sou professor aqui há 10 anos, e sinto-me filho desta comunidade, até porque os meus antepassados são oriundos desta ribeira. Tenho a percepção que o desenvolvimento de Boa Entrada está num ritmo um pouco lento, tendo em conta as potencialidades existentes. Digo isso porque desde que estou a trabalhar aqui, as infra-estruturas existentes são praticamente as mesma: a escola, placa desportiva e nada mais”. 

Consumo de álcool entre jovens é  preocupante 

Conforme “Cau”, na Boa Entrada, há três camadas destintas de jovens. “Uns que são estudantes, alguns até já formados e trabalham na cidade da Assomada e Praia e voltam apenas aos fins-de-semana para visitar os familiares. Há aqueles que são agricultores e criadores de gado. E existe um número expressivo de jovens que nem estudam nem trabalham. E está é a camada mais preocupante porque estão metidos no consumo de álcool, droga e também alguns actos de roubos que acontecem na localidade”.

Segundo “Cau”, caso não forem tomada medidas urgentes para reverter a situação daqui há cinco a dez anos, Boa Entrada não terá jovens suficientes em bom estado de saúde. “No quadro actual no universo de 100 jovens cerca de 70 já estão encaminhados para o consumo de álcool, droga e roubos nas residências, escolas e propriedades agrícolas”.

Agricultura: fonte de rendimento

A agricultura é o principal fonte de rendimento das famílias da Boa Entrada. O cultivo de regadio é feito num misto de tradicional e moderno. Muitos agricultores ainda fazem rega por alagamento e poucos são os que usam o sistema de irrigação por gota a gota e que fazem cultivo em estufa. Apesar de dois anos de seca consecutivos e consequentemente diminuição de quantidade da água disponível para rega, os agricultores estão a ter uma produção razoável e livre de pragas.

Belmiro Tavares “Mimi”, de 81 anos, é um dos mais antigos agricultores de Boa Entrada. Apesar da idade, “Mimi” conta que todos os dias desce a sua parcela agrícola para cuidar de uns pés de cana sacaria e umas mandiocas, através de rega por alagamento. E, ao mesmo tempo, vigia as suas mangueiras que estão paridas, evitando ser roubado pelos os mais jovens.

“Mimi” revela ainda que, durante muitos anos, desde o tempo colonial, trabalhou no viveiro de plantas em Boa Entrada e por isso diz que boa parte das mangueiras que estão espalhadas, um pouco, pela ilha de Santiago saiu das suas mãos. Este ancião recorda ainda que Boa Entrada, no passado, foi um celeiro do café, manga, laranja, limão, lima, pinhão e goiaba. “Estas plantas acabaram porque as pessoas começaram a arrancar para colocar cana sacarina para produção do grogue”.

Já, Jacinto Semedo “Quinto”, 54 anos, é um agricultor da nova geração dos agricultores que aposta na modernização de técnica do cultivo, utilizando sistema de rega gota a gota e cultivo em estufas. “Quinto” conta que na sua parcela agrícola de três hectares cultiva diversos tipos de produtos, nomeadamente tomate, pepino, vage, cenoura. “Decidi apostar no cultivo em estufa porque produz-se mais rapidamente e depois evita ataque das pragas. E por outro lado gasta –se  menos água”. “Quinto” apela o Ministério da Agricultura para dar mais atenção aos agricultores de Boa Entrada que são uns dos principais abastecedores do mercado de Assomada.
   

Excedente de produção de frutas sub-aproveitada

Boa Entrada é um dos principais produtores de manga e papaia de Santa Catarina. Normalmente, no ano de grandes produções, para além da baixa do preço, os excedentes ficam a estragar ou apenas servem para alimentar os animais. Segundo os moradores, na época de produção de manga entre Junho e Agosto, a papaia fica a estragar porque ninguém consome. E por outro lado, mesmo a manga quando não é vendida ao desbarato fica a danificar-se, porque não há uma preocupação em transformar esses produtos.

Fonte: A Nação

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